domingo, setembro 20

Capítulo Vinte e Quatro Ponto Um

(...)


_ Esse é o meu filho Billy – explicou Jessie, fazendo as apresentações. Não que o rapaz tivesse deixado Jessie desviar sua atenção.
_ Onde é que esteve até agora? As coisas estão bem sérias no Q.G.
_ O que quer dizer com ‘sérias’? – Jessie deu um olhar indiferente ao filho – O que há de errado com sair pra fazer compras com a minha filha?
_ Eu não sei os detalhes – Billy parecia desconfiado – mas você foi rotulado como ‘um elemento indesejado’. O que foi que fez desta vez? Briga? Aposta? Foi atrás da esposa de alguém de novo?
_ Hmph – fez Jessie, com um sinal de pouco caso – Isso são só rumores sobre mim. Só cascata, vê se não acredita nisso. Hmph, desde que entrou pro ‘Ethos’, você virou um chato...!
Billy não teve o que dizer, ou não teve tempo para tal, pois Jessie indicou Elly e continuou:
_ Essa moça impediu que Primera fosse seqüestrada. Por que não ajuda de uma vez, então?
_ Bem... – Elly adiantou-se – Podemos ter uma apresentação ao ‘Ethos’, então?
_ Ah, claro – Billy apressou-se em dizer, voltando o olhar para ela – Por favor, perdoe meus modos. Eu não sabia que você havia salvado minha irmã. Me deixe contatar o departamento médico na minha base. Tenho outras questões a resolver, considerando que não sou apenas um padre, mas também um Etone. Então, não posso fazer qualquer promessa.
_ Então, vai nos apresentar? – perguntou Elly, e Billy confirmou.
_ Sim. Paremos no quartel-general do ‘Ethos’ depois disto.
_ Hmm. Um padre e um Etone ao mesmo tempo... – interessou-se Margie – Isso não é incomum? O ‘Ethos’ é obviamente muito diferente da minha Seita de Nisan.
_ Sua Seita de Nisan? – Billy voltou-se para ela, visivelmente interessado – Você é de Nisan?
_ Sim, sou Marguerite – ela adiantou-se, fazendo uma profunda saudação diante de Billy – Prazer em conhecê-lo, Padre.
_ O prazer é meu – Billy retribuiu, sorrindo para Margie – Eu nunca tive uma chance adequada de falar com outros sobre suas religiões. Podemos conversar mais tarde?
_ Claro, seria um prazer – ela concordou sorrindo – Mas não posso demorar muito. Estou um pouco atarefada agora.
_ Muito obrigado – Billy agradeceu, curvando a cabeça. E então pareceu reconhecer algo familiar – Hmm... Marguerite? Onde foi que já ouvi esse nome?
_ Tá bom, esquece isso, relaxa – cortou Bart, entrando sem qualquer cerimônia entre sua prima e o Etone, parecendo muito incomodado com a atenção que Margie estava tendo – Eu vim aqui pra falar com o ‘Ethos’. Vamos andando.
_ Que pessoa sem modos – Billy olhou com desaprovação para Bart – Deveria aprender a falar um pouco mais apropriadamente.
_ O quê, ô? – Bart olhou feio para Billy, que o ignorou e voltou-se para o grupo.
_ Bem, todos, avisarei ao Q.G. do ‘Ethos’ que estão indo. Venham assim que puderem.
_ Já sei, já sei – interrompeu Bart exasperado – Vamos indo.
_ Ei Billy – Jessie chamou o filho – Eu tenho uns assuntos pra cuidar. Se vai pro quartel general, dá pra levar Primera de volta pra casa dos pirralhos pra mim?
_ ... Tudo bem – ele parecia desaprovar Jessie a cada gesto – Vamos, Prim.
Billy afastou-se e Primera, depois de despedir-se apressadamente e em silêncio, o seguiu. E Jessie também se voltou para Citan para se despedir.
_ Bem, preciso ir andando. Té mais, Hyuga. Eu sei que vou te ver de novo por aí.
_ Er... Bem, quem sabe?
_ Ah, tá. Que seja – e fez uma reverência a Elly e Margie – Vejo você mais tarde, moças.
E deu uma piscadela para ambas, antes de partir. Citan balançou a cabeça negativamente, comentando em voz alta:
_ Ele não muda, nunca... Bem – voltou-se para os outros – Sigurd disse que vai terminar em breve com a Yggdrasil.
_ Opa, sério? – Bart animou-se – Beleza, dessa vez podemos mesmo deixar o porto!
_ Vamos voltar... para Aveh? – Elly perguntou, indecisa, mas Bart voltou-se para ela com surpresa evidente em seu único olho .
_ Tá brincando? Temos que cuidar do Fei primeiro! Aquele boca mole disse que ia nos apresentar ao ‘Ethos’. Então, acho que vamos ter que ir ao Q.G. deles antes.
Elly sorriu. Bart podia ter muitos defeitos, mas ninguém podia dizer que ele não tinha consideração pelos amigos. Fosse como fosse, ele só resolveria seus próprios assuntos depois que todos estivessem bem.
_ ... Obrigada.
_ Ah... – voltou-se, fazendo uma voz aborrecida – Por que você precisa me agradecer?
_ Heh – Margie conteve o riso – Ele tem razão, Elly.
_ ... É... Acho que tem razão.
O Q.G. do ‘Ethos’ ficava ao norte da posição atual da Thames, e sendo assim, Sigurd lançou a Yggdrasil II naquela direção. Estando Fei inconsciente, Citan achou por bem ficar para trás para o caso de um eventual problema com as máquinas ou alguma alteração brusca em sua condição, enquanto Elly, Bart e Rico seguiriam para o ‘Ethos’. Agora num modelo submarino, a nave de Bart não tinha como aportar nas escarpas rochosas por volta das ilhas, mas as praias baixas eram uma opção melhor, e foi numa delas que Sigurd parou.
O prédio do ‘Ethos’ era semelhante a uma grande catedral, em escala ainda maior do que aquela em Nisan, cercado por muralhas altas e imponentes de cor dourada, como o prédio. O trio foi saudado na entrada por Billy, que os cumprimentou com um aceno de cabeça.
_ Estivemos aguardando por vocês. Recebi permissão para tratar Fei desde que seja na enfermaria do salão de prática. Deixemos que os membros do ‘Ethos’ cuidem do resto.
_ Sim – Elly concordou – Por favor, tomem conta de Fei por mim.
Os procedimentos de transferência tiveram lugar. Com o auxílio e os veículos do ‘Ethos’, Fei foi transferido juntamente com o equipamento médico da enfermaria da Yggdrasil para a ala médica, e Billy acompanhou o grupo de Elly.
_ Os irmãos do ‘Ethos’ estão cuidando de Fei na enfermaria. Por favor, me acompanhem. Eu os levarei até ele. Por aqui, sigam-me.
O grupo seguiu o padre rumo às dependências interiores do Q.G. do ‘Ethos’, e no caminho depararam com outro religioso, que veio até Billy e comentou:
_ Billy, ouvi dizer que seu pai esteve razoavelmente ativo outra vez.
_ Verlaine... – Billy parecia embaraçado ao ter que ouvir recriminações em nome de seu pai novamente, especialmente diante de pessoas estranhas. E Verlaine não se deteve:
_ É dito que houve um ataque a uma área de escavação que feriu muitos dos meus ‘irmãos’ e trabalhadores. Bem – ele pareceu mudar de atitude – você é mais do que um ótimo Etone; destruindo os Ceifadores e provendo a justiça do ‘Ethos’ ao mundo. Mas o seu pai...
_ Somos pai e filho apenas no sangue! – Billy retrucou, perdendo a tranquilidade – Não tenho nada a ver com aquele homem.
_ Não me entenda mal – Verlaine apressou-se a retificar – Não suspeito de você, nosso bom ‘irmão’. Só quis informar sobre seu pai.
E deu as costas, desaparecendo por uma das portas, enquanto Billy cobria os olhos, parecendo tentar reunir sua paciência perdida e comentando consigo mesmo:
_ ... Esse meu pai... Gostaria que ele pensasse na minha posição antes de agir – voltou-se então, parecendo lembrar dos acompanhantes, e deu um sorriso fraco – Por favor, perdoem a interrupção. Me acompanhem.
O trio seguiu Billy rumo ao subsolo, e mais além. A abadia tinha algo de moderno e arcaico ao mesmo tempo, os tijolos e luminárias dando uma impressão de solene antiguidade enquanto que as portas dos corredores, abrindo-se com sensores de proximidade, faziam pensar em tecnologia avançada. Por fim, chegaram ao compartimento onde Fei estava sendo tratado por um enfermeiro, e Billy perguntou:
_ Como ele está?
_ O paciente ainda não recobrou a consciência – respondeu o enfermeiro – mas não vemos qualquer anormalidade com seu cérebro. A baixa temperatura da água reduziu seu metabolismo e o salvou. Um passo em falso e ele poderia ter sofrido morte cerebral.
_ Hmm – fez Rico, imaginando que neste caso, a condição de Fei prenunciava melhoras em breve – Então...
_ Sim, não se preocupem – confirmou o enfermeiro – No entanto, precisamos conduzir mais testes por algum tempo. Depois disso, ele pode ser tratado em suas instalações médicas.
_ ... Há alguma previsão para quando Fei vai recuperar a consciência? – quis saber Elly.
_ A razão para que não tenha recuperado a consciência é exaustão física. Ele exauriu a si mesmo. Provavelmente vai custar-lhe mais alguns dias, mas não se preocupe, ele vai acordar.
_ Entendo – ela aproximou-se da cabeceira da cama, olhando com tristeza para o inconsciente Fei – Sinto muito, Fei. Eu fiz a sala de máquinas perder o controle...
_ Ei Elly, isso não é verdade – Bart interrompeu, meneando a cabeça – Você não pôde evitar ser hipnotizada. Não precisa se sentir culpada. Mais importante, foi você quem salvou Fei. Você o protegeu do Ramsus. Não é?
Isso podia ser verdade, mas não a deixava muito satisfeita. Mais efetivo foi isso ter sido dito por Bart, e Elly sorriu.
_ Obrigada...
_ Pode demorar mais algum tempo terminar o tratamento dele – lembrou Rico aos dois – Vamos matar tempo em algum lugar.
_ Eu... – Elly pareceu encabulada – Queria ficar mais um pouco. Tudo bem?
_ É, faça isso – Bart sorriu – Tenho certeza de que o Fei vai ficar feliz. Bom, chame quando terminar. Deixo o resto com você.
Bart e Rico aproveitaram para conhecer um pouco melhor as instalações do ‘Ethos’. Naturalmente, pisos inferiores ao da enfermaria estavam bloqueados ao público, mas puderam seguir para os pisos superiores, e por toda a parte encontravam o símbolo da ordem religiosa científica, uma cruz com algo semelhante a chifres curvos de bode na extremidade superior. Em toda a parte que visitaram, pessoas falavam do trabalho dos Etone em eliminar os ‘Wels’ – Ceifadores – de Aquvy, e como o ‘Ethos’ provia os necessitados com abrigo e paz aos seus espíritos, principalmente numa época conturbada como aquela, onde Aveh e Kislev lutavam no continente e os Ceifadores atacavam em Aquvy. Ainda estavam na nave principal quando Elly veio até eles, e Bart perguntou:
_ E então, Elly, Fei já teve o tratamento médico?
_ Sim... Parece que ele vai ficar bem. Venham, vamos até a enfermaria.
O trio novamente desceu até a ala médica, e foram alegremente recebidos pelo enfermeiro.
_ Alô, todos. O tratamento dele terminou.
_ A propósito – perguntou Bart – Fei recuperou a consciência?
_ Infelizmente, o paciente não recobrou a consciência ainda. Mas não há necessidade de se preocupar – ele acrescentou apressadamente – Quando ele se recuperar fisicamente, também vai recobrar a consciência. Podem leva-lo ao seu navio agora.
_ Deve ter feito um bocado de esforço – observou Rico.
_ Por favor, não se incomodem. Fiz meu trabalho como um homem do clero.
_ Muito agradecida – Elly curvou levemente a cabeça, e então olhou em volta – Um... Onde está Billy? Eu gostaria de agradecer a ele, também...
_ Ah, sim, o Irmão Billy. Ele voltou ao orfanato. Estava preocupado com as crianças deixadas sozinhas.
_ É, o Billy realmente nos ajudou um bocado – admitiu Bart – É melhor agradecermos a ele por essa.
_ Vamos primeiro levar o Fei pra Yggdrasil. E podemos ir de lá.
Sigurd e Citan comandaram os procedimentos de transferência, e com o auxílio do departamento médico do ‘Ethos’, logo estavam todos a bordo e prontos a seguir rumo sudeste, onde estava localizado o orfanato de Billy. Depois de cobrirem uma distância considerável, passaram por uma ilha onde uma estrutura enorme e de aparência antiga erguia-se, e foi Sigurd quem informou:
_ É chamada ‘Torre de Babel’. De acordo com as lendas, foi construída por gente da antiguidade que tentou alcançar Deus nos céus. Irritado com tamanha ousadia, Deus destruiu a torre com um raio. A estrutura é muito antiga, isso é fato, e os tripulantes da Thames sempre falavam nela com receio. Ao que parece, há muitas superstições em Aquvy ligadas a essa torre.
_ ‘Torre de Babel’, é? – Bart olhou para o alto, percebendo que não conseguia encontrar o topo da estrutura, por mais que procurasse – Legal. Talvez algum dia possamos fazer uma visita, quando o Fei acordar. 


A MILLION SHADES OF LIGHT

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