Capítulo 24: Um Jovem Padre
As disposições não eram das melhores na enfermaria
da Thames. Bart olhava em silêncio, para variar, enquanto Citan recebia do
médico de bordo as novidades:
_... Eu não sei. Mas por enquanto
ele está no suporte vital.
_ Você quer dizer... – a voz do
catedrático parecia incomumente emocionada, embora seu rosto mantivesse a
compostura – Ele vai ficar bem...?
_ ... Não garanto nada – replicou
o médico de bordo – Eu não sei por que ele está assim, pra começo de conversa.
Bart continuava em silêncio,
olhando à distância para a discussão. Por trás da tela à direita, na cabeceira
do leito, Elly estava sentada imóvel já fazia mais tempo do que pareceria, se
ela perguntasse, olhando para o rosto inconsciente de Fei.
_ ... Culpa minha...? Eu...
Em seu interior, ela achava que
poderia ter impedido aquilo. Fora tão surpreendida quanto os outros pela força
do Ataque Nereida quando manipulado por Ramsus, mas algo dentro de si insistia
que poderia ter feito algo antes... Talvez, se tivesse sido mais rápida...
_ Então, há esperança – a voz do
médico penetrou em seus pensamentos – ... Na enfermaria do Quartel-General do
‘Ethos’.
Isso a tirou de sua contemplação,
e ela correu entre as divisórias, passando por onde Bart se mantivera
respeitosamente e dirigindo-se diretamente ao médico.
_ Fei... Você pode salvar Fei?
_ Eu não posso garantir – replicou
o doutor – Mas se o levássemos ao hospital no Q.G. do ‘Ethos’...
_ Então poderíamos salva-lo?
_ Eu acho que então ele
provavelmente iria passar bem por essa... Mas, infelizmente, cidadãos comuns só
têm permissão de chegar até o salão principal do quartel general do ‘Ethos’.
Seria preciso ser um monge, ou ser apresentado por alguém de dentro...
Elly baixou seus olhos. Inútil,
então. Não havia como...
_ Ah, acabei de me lembrar – o
médico de bordo exclamou, batendo uma das mãos na outra – Ouvi dizer que os
Etone – ‘vigilantes do pecado’ – estão vindo à Thames do Q.G. do ‘Ethos’.
_ Que propósito tais Etone do
‘Ethos’ têm aqui? – indagou Citan.
_ Estão vindo fazer algum tipo de
investigação.
_ Etone... – Bart ponderou – O que
são eles?
_ São gente religiosa do ‘Ethos’,
que purificam dos ‘Ceifadores’, ou Wels, que aparecem aqui em Aquvy.
_ Então, por que não pedimos a
eles? – sugeriu Elly.
_ Vou pedir a eles se podem nos
ajudar – garantiu o médico – mas não sei se eles o farão... Mas acho que não há
mal algum em tentar.
_ Certo. Vamos procurar por eles.
_ Eu irei com Fei e as máquinas de
suporte vital para a Yggdrasil – disse Citan – Bart e Elly, vão os dois
procurar pelos Etone.
_ Certo.
Elly e Bart saíram para o convés
onde, segundo informações da tripulação da Thames, era onde encontrariam os
Etone. E ficaram surpresos ao encontrar Margie conversando com um dos marujos
quando chegaram à área externa.
_ Etone? Eu o vi agora a pouco,
mas ele partiu.
_ Mesmo? – a moça perguntou,
enquanto Bart e Elly se aproximavam – Pra onde ele foi?
_ Não sei...
_ O que você tá fazendo Margie?
_ Oi Bart. Acabei de ouvir o que
houve pelo Citan. Também estava procurando por aquele Etone. Essa pessoa disse
que o viu antes.
_ Sério?
_ Ei, pare de resistir!!
As atenções dos três se voltaram
para procurar pela fonte da comoção, e Elly foi a primeira a ver.
_ Bart, olhe!!
Dois sujeitos de aparência
suspeita haviam acuado uma garotinha de, no máximo, nove anos de idade, de
cabelos loiros muito claros e olhos verdes, e um deles se aproximou um passo,
olhando ameaçadoramente para a menina.
_ Se você não resistisse, eu
poderia te vender por mais.
A menina olhou assustada em volta,
percebendo que não conseguiria passar pelos dois. O homem mal encarado ergueu a
mão direita, mas antes que batesse na criança, o bastão de Elly o conteve, e a
moça se colocou entre a menina e os dois.
_ O que estão fazendo?!
_ Quê? – um dos dois, de cabelo
escuro, perguntou – Quem é você?
_ Ao invés da pirralha – o outro,
um loiro, falou enquanto inspecionava Elly de alto a baixo – que tal se eu
vendesse você?
_ O que! – Bart chegou devagar por
trás dos dois, soltando ostensivamente um dos chicotes – Querem um pouco?
Venham pegar, seus trouxas!
_ O quê? Acha mesmo que está com
essa bola toda, é?
E o brigão de cabelos escuros deu
um passo na direção de Bart, antes de um tiro marcar o piso a um centímetro do
seu pé, sobressaltando-o.
_ Quê!
_ Como foi?
Elly abaixou-se e protegeu a
menina, que se agarrou a ela. E da esquerda, veio um homem de meia idade,
cabelos cinzentos e rosto marcado com uma carabina apoiada no ombro, e o
primeiro dos mal encarados indagou:
_ Você! O que está fazendo?
_ Espere! – o outro pediu, olhando
para o estranho com o rosto subitamente alarmado – Esse cara é o...
Foi quando também o primeiro
pareceu reconhecer o recém-chegado, de sobretudo surrado e lenço vermelho
amarrado sob o queixo.
_ Ah não... Jesiah!! Droga... Eu
vou lembrar disso!
E os dois debandaram, enquanto
Elly tratava de acalmar a menininha.
_ Está tudo bem, querida. Eles não
vão mais...
E calou-se subitamente. O
desconhecido aproximou-se por trás dela e sacou novamente sua carabina,
colocando o cano da arma em sua cabeça, surpreendendo a ela, Bart e Margie.
_ O que pensa que tá fazendo? –
perguntou o pirata, e foi ignorado por Jesiah, que apenas advertiu:
_ Não se mova.
_ E-espere... – pediu Margie, mas
Jesiah respondeu do mesmo modo:
_ Calem-se, seus cães de Solaris.
E Elly reconheceu a ironia; seu
uniforme. Podia ter ajudado a criança, mas seu uniforme, obviamente conhecido
do homem, não inspirava confiança. E, se ela fizesse qualquer movimento...
_ Espere!!
Citan veio correndo até eles, algo
de reconhecimento em seu rosto enquanto comentou:
_ Um rifle carabina, e essa
técnica de tiro... Você deve ser Jesiah. Não, Jesiah, é um mal entendido! Está se
precipitando, como sempre. Ela só estava ajudando a menina!
_ Quê? – Jesiah voltou-se,
parecendo tremendamente admirado – Beijem o meu traseiro se não for você,
Hyuga...
A menininha separou-se de Elly e
foi até Jesiah, também, e embora não dissesse uma palavra, os gestos e sinais
que fez foram bem claros para o pistoleiro, que baixou a arma e acenou que sim.
_ É, eu sei, eu sei, Primera.
Entendi errado. Desculpe, moça. Por favor, levante-se.
Elly ficou de pé e voltou-se
então, ao que Jesiah inclinou a cabeça como desculpa.
_ Parece que você só estava
tentando ajudar. É o que ela diz. Desculpe pela confusão. Esta é Primera, minha
filha. Eu sou... Ah, me chame de Jessie. Já basta esses pirralhos me chamarem
de Jesiah.
Primera ergueu os olhos para Elly
e segurou a mão dela, sorrindo e fazendo sinais no que seria seu agradecimento,
embora Elly não tenha entendido a princípio. E coube a Jesiah explicar:
_ Ela disse ‘obrigado’. Aconteceu
algo a ela, e ela não fala desde então.
_ ... Essa é a menina que resultou
do seu casamento à mira do rifle? – perguntou Citan, parecendo brincar com um
velho amigo, e Jessie retrucou:
_ Que coisa mais rude pra se
perguntar! Olha pra a idade dela; Primera é minha segunda filha. Meu outro guri
já tem dezesseis.
_ Por favor, me desculpe – Citan
pareceu voltar ao seu eu costumeiro – Como está sua esposa?
Jessie baixou os olhos, fazendo
uma pausa que respondeu antes de si.
_ ... Está morta. E eu nem sequer
estava lá por ela quando ela morreu.
_ Entendo... – ao fim, todos os
homens eram escravos de seus afazeres, pensou Citan. Mesmo alguém como Jesiah.
Sacudindo a cabeça, ele procurou mudar de assunto.
_ O que está fazendo aqui?
_ Bem, preciso fazer compras em
algum lugar – Jessie deu de ombros – Além do que, meu filho tem alguns assuntos
insalubres nesta área.
_ Ah, desculpe – um membro da
Thames tocou o ombro de Margie – Aquele Etone que você estava procurando acabou
de chegar.
_ Quê? – perguntou Bart,
voltando-se para procurar – Onde?
Um rapaz vestindo o longo hábito
verde escuro dos Etone do ‘Ethos’ e os cabelos cinzentos de Jesiah
aproximou-se, acompanhado do médico da Thames, que estava explicando a situação
a ele.
_ E é por isso que, de algum modo
que puder, ficaríamos gratos se nos ajudasse.
_ Entendo... – o rapaz respondeu,
com expressão pensativa.
_ Pára de ficar enrolando e vê se
ajuda logo – Jessie interrompeu, abrindo caminho entre Citan e Elly, e o rapaz
ficou surpreso ao vê-lo.
_ P-pai? E Prim também?
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