E então, de onde a gente continua?
Capítulo 13: A Capital de Kislev
Um órgão enorme soava, com
saídas sonoras enormes por todo o aposento. O Imperador tocava com os olhos
fechados, deixando-se levar pela melodia como sempre. Há muito tempo descobrira
que o governo era uma responsabilidade extenuante, mas podia consolar-se com o
fato de que o velho órgão estava lá. Não havia exigências na música, nem prazos
que precisavam ser cumpridos. Enquanto tivesse a música para tocar, o
governante de Kislev sempre poderia relaxar e esquecer seus problemas, mesmo
que por pouco tempo.
_ Kaiser, nós temos notícias!
E cada vez menos tempo, pensou
ele. Sem se voltar, o Kaiser Sigmund de Kislev apenas concordou com a cabeça,
num sinal para que o outro prosseguisse. Não queria parar de tocar. Isso também
o ajudava a encontrar as melhores soluções.
_ Nós investigamos a causa da
recente explosão na fronteira ao sul com Aveh. Nossos dados mostraram uma
grande quantidade de radiação sendo liberada no epicentro. Provavelmente foi
causada pela sobrecarga de um gerador de nave de combate Classe Escrava. A
causa para isso ainda é desconhecida. As ondas de choque dessa explosão
arrasaram dois terços das forças de Aveh e da Gebler combinadas. Agora, Aveh
está no processo de reagrupar suas unidades reserva, mas isso deve levar ao
menos vários dias.
“Conforme sua ordem, os
batedores chegaram da área que pediu...”
_ Encontraram, hein...?
_ Sim, senhor.
_ Entendo.
_ Nós sabemos que o Gear
encontrado foi roubado da décima primeira base pela unidade Gebler em Aveh. E,
na investigação da máquina, também prendemos o piloto inconsciente. O Gear foi
transportado para a capital. A julgar pelas circunstâncias, acreditamos que a
informação vazou para Aveh.
_ Como pode dizer isso?
_ Todos os Gears, exceto este,
foram destruídos em Lahan. A julgar pelo sinal ID, este não estava com Aveh,
mas era parte de um grupo pirata.
_ Piratas? – o Kaiser pareceu
mais interessado, embora continuasse tocando – Você quer dizer o jovem
príncipe?
_ Sim senhor. Agora estamos
analisando os dados de combate. No entanto, encontramos algumas caixas pretas
que parece retardar as análises.
_ Caixas pretas?
_ Aquele Gear não foi feito
por nós. O corpo principal foi trazido por ‘eles’.
_ Então é isso...
O Kaiser Sigmund ponderou
profundamente. Aquele Gear negro que lhe dava calafrios fora encontrado próximo
à fronteira, como ele suspeitou que seria. Ele não sabia o que esperar daquela
máquina, mas lhe dera uma má impressão desde a primeira vez em que pusera os
olhos nele, e quando seus batedores em Lahan encontraram restos de pilotos e de
todos os Gears, exceto pelo misterioso Gear Negro, Sigmund sempre soubera que
tornaria a encontrá-lo. Estava feliz por não ter sido como um inimigo; sempre
suspeitara que a descarga de energia que destruíra Lahan devia ter algo a ver
com aquele Gear misterioso. E agora, outra explosão, outra reação de energia e
lá estava a máquina negra outra vez, com segredos que não eram fáceis de
decifrar. Sigmund pensou no piloto do Gear e perguntou-se se ele teria a menor
idéia do que pilotar aquela máquina poderia significar.
_ Hã... Kaiser?
_ O quê?
_ Não deveríamos iniciar um
ataque a Aveh?
Só então Sigmund parou de
tocar o órgão, apesar de não ter se voltado ainda para seu assessor.
_ Está tentando destruir
Kislev?
Era com certeza a última coisa
que o rapaz esperava ouvir, e ficou claro que ele não estava entendendo.
_ Obviamente seria fácil tomar
Aveh – explicou o Kaiser – Mas isso também esgotaria nossos recursos.
_ Mas nós não podemos perder
esta chance...
_ Mesmo que derrotemos
Shakhan, Solaris vai simplesmente substituí-lo por algum outro fantoche. E se
exaurirmos nossos recursos e nos descobrirmos sob ataque? De qualquer modo,
ainda devemos nos preocupar com Nisan. Não há nada a se ganhar fazendo qualquer
coisa agora.
_ Com licença!
Um jovem oficial entrou
apressado, e Sigmund finalmente deixou seu órgão e suspirou profundamente, como
se estivesse cansado. Já esperava por aquela interrupção.
_ Parece que ‘eles’
chegaram...
‘Eles’, fossem quem fossem,
vinham numa enorme nave que se pareceria com uma grande esfera negra, com um
cálice na parte mais alta. A nave atracou no porto da fortaleza imperial e um
enorme container foi baixado por dois Gears. Uma passarela de desembarque
estendeu-se até o sítio de desembarque e uma comitiva pequena seguiu até a
presença do Kaiser e seus homens. Três figuras encobertas por capuzes azuis e
de aparência cerimoniosa deram passagem a uma quarta figura, mais imponente e
com um manto e capuz vermelho de Executor. Apesar da sua voz abafada, no
entanto, era fácil perceber que se tratava de uma mulher.
_ É isso? – perguntou Sigmund.
_ Sim – confirmou a mascarada
– Se usar isso, poderá passar pela barreira. Estará livre para ir onde e quando
quiser.
_ Aquele homem... O que era?
Grahf? Ele está por perto?
_ Está muito ocupado por
enquanto – respondeu a mascarada – Eu fui designada como sua representante.
_ Vou perguntar mais uma vez. Por
que nos ajudam? Quem são vocês?
_ Eu já disse antes.
Simplesmente desejo observar o que está reservado para o mundo. Há tantas
coisas que seu povo deve saber... Sou meramente a sua guia. Eu não posso
ajudá-los diretamente. Como usam minha ajuda cabe inteiramente a vocês.
_ Está me dizendo então que
não pede qualquer recompensa?
_ Deixe-me ver... – ponderou a
desconhecida – Bem... Que tal isso, então...?
E adiantou-se, sussurrando
algo no ouvido de Sigmund para se retirar depois com sua escolta, enquanto o
Kaiser comentava consigo mesmo:
_ Mas que coisa estranha para
se pedir.
_ O que ela disse? – perguntou
o assessor.
_ Querem que eu transfira o
Gear que capturamos e seu piloto para o Bloco D...
_ Bloco D? Eu me pergunto por
quê.
_ Também não sei... – Sigmund
meneou a cabeça – Mas ainda devemos um favor a eles e não podemos simplesmente
negar. Cuide disso.
_ Sim, senhor.
Em outro lugar, um crucifixo
ondulava de um lado para o outro. A luz cintilava em cada extremo do seu
balanço e parecia tilintar com um som metálico. Fei não sabia onde estava, mas
corria sem se voltar em meio à escuridão. Ele riu, sem saber bem por que, e
notou que sua sombra seguia o movimento do crucifixo ondulante, aparecendo à
sua esquerda e direita conforme esse movimento. E a luz que cintilava pareceu crescer
no metal, ficando mais e mais intensa até que um novo cenário surgiu.
Ele flutuava sobre uma casa que
lhe era familiar, pequena e cercada por árvores. Mas não era sua casa em Lahan,
nem em qualquer lugar onde se lembrasse de ter estado. Uma sensação cálida e
confortável parecia vir dali e ele viu-se diante da porta da frente da
habitação. Então, não estava mais sozinho.
Uma mulher de aparência
familiar brincava com um menino diante da casa. O riso do menino era
contagiante e ele achou que era o tipo de infância que gostaria de ter tido,
com sua mãe jogando a bola para ele.
Então notou algo de errado. A
mãe jogava a bola. O menino a deixava escapar. A bola começava a se afastar,
mas ele a alcançava. Em seguida, ia devolver a bola para a mãe e... a cena
parecia voltar ao momento em que a mãe jogava para ele, no início da sequência.
Depois da segunda repetição, Fei teve certeza de que aquela cena estava
incompleta. Mas por quê?
E ele se viu diante do que
parecia uma tela de cinema. Era onde a mãe e seu filho apareciam. Havia um
menino sentado assistindo a isso e ignorando-o por completo, como se não
estivesse lá.
_ Onde... eu estou...?
Não conseguia se lembrar de
nada anterior àquilo. Quis aproximar-se e perguntar ao menino o que acontecia
quando sentiu que não estava mais sozinho. Voltou-se e viu atrás de si o mesmo
menino cujos cabelos escondiam o rosto que já vira antes, em algum lugar. Era
estranho. O primeiro menino dava uma sensação de familiaridade e alheamento; o
segundo, no entanto, era claramente uma ameaça.
_ Você não devia estar aqui.
Foi tudo o que o recém-chegado
disse. O som de portas se fechando se fez ouvir, e Fei soube sem se voltar que
o menino diante do projetor sumira. No segundo som, o garoto de rosto coberto
sumira. No terceiro, tudo escureceu.
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