Vou pedir licença ao amigo Akira, onde estiver, pra usar o blog num projeto pessoal. Once upon a time, eu quis que um amigo curtisse uma história sensacional que tinha encontrado num dos meus jogos de videogame. Esse amigo, muito inspirado, decidiu começar a colocar online a tradução/interpretação que este servo mandava pra ele.
Parece que outros fãs do jogo acabaram por descobrir, e curtiram. Eu fiquei contente por divulgar a história de um jogo que curtia, e depois me dei conta que pessoas que nem entendiam direito o enredo passaram a gostar ainda mais, ao entender o que catzo que tavam falando.
Por algum motivo obscuro, a página onde todos os capítulos estavam sumiu. E recentemente, me caiu a ficha de que todos os capítulos continuam comigo; logo, é só uma questão de postar de novo. Sem o mesmo brilho e inventividade do meu amigo colocando isso online da última vez, nem de maneira tão ordenada; não tenho esse talento. Mas a todos os fãs da série, eu digo; pretendo recolocar Xenogears, traduzido e adaptado, de volta no ar.
E a quem nunca leu, ofereço a chance de conhecer e curtir a história. Se puderem tolerar minha adaptação tosca de fã, e os posts que vão ficar na ordem de postagem (e não organizadinhos num 'índice', como antes), espero que se divirtam tanto quanto eu. Boa leitura ^_^
XENOGEARS
(Compilado e Adaptado por Louco)
PRÓLOGO: Aconteceu há muito
tempo.
A
‘Mahanon’, uma grande nave colonizadora, enfrentou um súbito problema em seus
sistemas. De repente, depois de uma luz, todos os monitores da cabine de
comando registraram perigo. A tripulação alertou que os controles estavam um a
um sendo dominados por... algo.
O capitão imediatamente ordenou que o
comando manual fosse estabelecido, mas o desligamento do sistema automático
falhou. Contatos com a sala de máquinas também falharam. Ao perceber uma
espécie de programa-vírus dominando todo o maquinário, o capitão ordenou a
evacuação imediata dos passageiros e da tripulação, incluindo o pessoal da
cabine de comando. Ficando para trás ele viu, horrorizado, que o invasor
desconhecido dominara os sistemas de defesa da nave e estava usando os canhões
da “Mahanon” contra as naves de fuga que saíam, impedindo que alguém escapasse
vivo. Os enormes cabos de energia da nave romperam o casco e começaram a se
agitar no espaço como se fossem os tentáculos de algum monstro, e uma mensagem
repetida tomou todos os monitores da cabine em letras vermelhas.
“Vocês se
tornarão deuses.”
O painel
que o capitão ativou em seguida era independente do sistema contaminado. Ele
digitou sua senha, ligou o sistema de autodestruição e então deu uma olhada no
relicário que trazia consigo, uma foto com a esposa e a filha que não
tornaria a ver. Segundos depois, uma série de explosões programadas fez a
‘Mahanon’ desaparecer num clarão, próxima à órbita de um planeta.
Próxima aos
destroços do corpo principal da nave, “ela” se levantou. Os longos cabelos
púrpura ondulavam com o vento e seus olhos refletiam a escuridão da noite e as
estrelas cadentes que eram as demais partes da nave caindo. Foi neste dia que
“Deus” e a “humanidade” chegaram a Ignas...
Capítulo 1: A Vila de Lahan
A guerra
durou por tanto tempo que as pessoas esqueceram da causa, conhecendo apenas o
círculo sem fim de hostilidade e tragédias. A obsessão crônica da guerra em
breve encontraria uma mudança devastadora. Isso se deveu ao “Ethos”, uma
instituição que preserva a cultura do nosso mundo, reparando ferramentas e
armas escavadas das ruínas de uma civilização antiga. Ambos os países escavavam
estas ruínas e pediam ao “Ethos” que consertasse as descobertas, a fim de
aumentar seu poder militar.
As variadas
armas escavadas das ruínas alteraram grandemente o desempenho do esforço de
guerra. O resultado das batalhas entre os dois países não era mais determinado
pelo combate homem a homem, mas por ‘Gears’ – máquinas de combate humanóides
gigantes – que eram obtidos do interior mais profundo das ruínas.
Eventualmente, depois de mudanças constantes no estado de guerra, Kislev
conseguiu ficar por cima. O principal fator por trás disso estava na enorme
diferença entre a quantidade de recursos enterrados no interior de suas ruínas.
Mas, de repente, uma força militar misteriosa apareceu no continente de Ignas.
Chamados de ‘Gebler’, esta força decidiu fazer contato com Aveh. Com a ajuda
desta força militar Gebler, Aveh conseguiu recuperar-se de sua desesperada
minoria para voltar até a fazer par com Kislev. Então, tomando vantagem de sua
recém-conquistada aliança, Aveh começou a capturar um território após o outro
de Kislev, sem mostrar qualquer indicação de diminuir sua campanha de invasão.
A história
começa na vila remota de Lahan, nos limites de Aveh, próxima à fronteira de
Kislev...
A vila está
em chamas. Pessoas correm por toda a volta enquanto a escuridão da noite é
rompida pelo tom vermelho-brilhante das labaredas em seus lares. Um grupo de
Gears militares enfrenta um Gear solitário, pilotado pelo jovem Fei Fong Wong,
já cansado pelo esforço.
_ Huff... Puff... Malditos!
Apesar de nunca ter pilotado
um Gear na vida, Fei conseguiu derrubar alguns dos soldados sem maiores
problemas. Mas os Gears inimigos tornaram a se pôr de pé.
_ O que,
raios, é você? – ele pergunta – Não importa como eu o derrube, ainda consegue
ficar de pé?
A poucos
metros da batalha o Dr. Citan Uzuki, amigo próximo de Fei e do povo da vila tenta
se fazer ouvir:
_ Fei,
pare! Você não deve lutar aqui!
Uma rajada
de metralhadora do Gear inimigo e Fei procurou desviar, sendo atingido por
pouco pelo mesmo que acabara de derrubar. Tornando à carga, o Gear de Fei
atinge mais uma vez o outro e torna a derrubá-lo.
_
Maldição... Por quê? Por que tiveram de vir aqui? Pra quê fazer isso?
A única
resposta é o som das chamas que continuam consumindo a vila, alheias à luta.
Mais duas
pinceladas e parecia pronto. Com um olhar crítico, Fei se afastou um pouco da
tela e achou que bastava por hora, resolvido a tirar uma folga. Não tinha idéia
de onde viera a inspiração que o levara a pintar aquele quadro, mas quando dera
por si, já estava bem adiantado no trabalho. Geralmente, só pintava os
arredores de Lahan, onde vivia. Era um rapaz alto, de longos cabelos castanhos
presos e também era um mistério. Três anos antes, ele aparecera em Lahan todo
sujo de sangue e ensopado da tempestade. Muitos dos aldeões não acharam que
suportaria, mas o líder da vila o acolhera e a constituição firme do rapaz
impedira o pior. No entanto, ele não se lembrava de coisa alguma anterior a
isso, sabendo apenas que fora entregue ao chefe da vila por um estranho
mascarado. Havia quem supusesse que o homem fosse o pai de Fei, mas nem mesmo o
rapaz podia saber com certeza. Comentavam também sobre os pesadelos terríveis
que ele tivera pouco depois, onde sempre chamava pelo pai. No entanto, ele
mesmo não tinha qualquer lembrança anterior aquilo.
Tendo
terminado sua pintura, Fei resolveu ir ter com os amigos no andar de cima da
sua casa, que conversavam animadamente com Lee, o chefe da vila. Entre eles
estava Timothy, que foi o primeiro a vê-lo se aproximar.
_ Oi
Fei! Desculpe usar a sua casa desse
jeito, mas precisávamos nos reunir aqui hoje. É preciso conversar com o chefe
sobre o grande dia de amanhã.
_ Ah,
claro, o seu casamento com Alice! Isso sim é um grande dia!
_ Bom... é
mesmo... mas ainda é meio difícil pensar nisso como realidade, sabe?
Fei se
afastou um pouco, como se estivesse sem graça, antes de dizer:
_ Hã,
Timothy... Eu só quero agradecer a você e à Alice... Há três anos, eu acordei
nessa vila sem o menor vestígio da minha memória... não sabia quem era, onde
tinha estado ou o que tinha feito até aquele dia... não podia me lembrar de
nada. E, apesar disso, você e Alice simpatizaram comigo e me encorajaram a
seguir em frente. Se vocês dois não estivessem lá comigo, não sei o que teria
me acontecido... – e, voltando-se para o amigo - Do fundo do coração, Timothy,
obrigado mesmo! Você e a Alice merecem viver juntos pra sempre!
_ Hah,
corta essa! – riu o outro – Não precisa ficar todo sentimental comigo... Seja
como for, sempre senti como se tivesse sido seu amigo desde que éramos meninos.
E vamos continuar sendo amigos pra sempre, certo?
_ É claro!
_ Ah, Fei,
a propósito... – e pareceu lembrar de algo – Será que você podia ir ver como
está a Alice? Ainda tem umas coisas pra eu discutir com meu pai e o Chefe Lee,
mas tenho certeza de que ela gostaria de companhia.
_ Claro, sem
problemas! Te vejo mais tarde, então.
Fei estava
prestes a sair quando entrou um garotinho pela mesma porta que ele usaria.
_ Ah, aí
está você, Fei! Eu queria falar com você sobre uma coisinha!
_ Ei, como
é que está, Dan? Tá animado hoje... Aliás, como sempre.
_ Ô, Dan,
não seja tão mal educado! – cortou Timothy – Pra quê entrar gritando desse
jeito?
_ Saco, o
Timothy também tá aqui – resmungou o menino - Não enche, Timothy! Até casar
com a minha irmã, você não tem nada a ver comigo. O meu negócio é com o meu
amigo aqui, o Fei. Pois é,
Fei, eu preciso falar com você depois...
_ O que
foi, Dan? – o ar grave do menino fazia parecer sério – Parece coisa grave.
_ E é
mesmo; por isso eu não posso falar aqui – e olhou feio para Timothy – Tem uma
certa pessoa ouvindo que podia causar problemas. Temos que falar sério, um a
um, de homem pra homem! Te encontro lá fora. - E voltando-se para Timothy:
_ Se cuida
até amanhã, Timothy – e mostrou a língua para o outro, saindo logo depois. Fei
ficou olhando confuso para a porta e para o amigo.
_ O que é
que há com ele, afinal?
_ E pensar
que a partir de manhã eu vou ser cunhado desse moleque... – Timothy deu de
ombros e riu - Hah! Essa parte não vai ser lua-de-mel!
Ainda rindo,
Fei saiu logo atrás de Dan. Era bom que Timothy tivesse aquele gênio animado;
com o mau humor de Dan por causa do casamento iminente da irmã, ele obviamente
iria precisar de ânimo!
Dan estava
no meio do caminho para a casa de Alice e, vendo Fei se aproximar, chamou o
rapaz de canto e perguntou:
_ Podemos
conversar agora, Fei? É importante.
_ Claro
Dan. O que foi?
_ Como você
sabe, amanhã finalmente é o dia do casamento da minha irmã... – falou o menino, solene – e é bem sobre isso que eu quero falar: o casamento da Alice.
Pra ser perfeitamente honesto com você, Fei... eu sempre quis que você fosse
meu irmão. Ainda não é tarde demais. Você podia seqüestrar a Alice e fugir com
ela! E, se precisar da minha ajuda, eu adoraria fazer qualquer coisa!
Fei ficou
sem ação diante da surpresa enquanto, num tom mais calmo e baixo, Dan segredou;
_ Pode ser
meio esquisito eu dizer isso, mas a minha irmã é bonita, cozinha bem... e, só
entre nós, ela tá com tudo em cima, também! Heh, heh heh! E aí? O que você acha?
_ Tá bom,
Dan, você venceu. Acho que eu vou simplesmente pôr Alice no colo e correr com
ela pra longe daqui!
_ Mesmo? –
o rosto do menino se iluminou – Eu sabia que gostava de você, Fei! Esse é o
espírito! Mas... ia ser preciso mudar os sentimentos dos dois, também. E você
precisaria gostar dela...
Como Fei
esperava, era mais uma das idéias de Dan. Bastava dar corda suficiente e ele
próprio percebia os furos do plano. O menino era genioso, mas tinha bom senso.
Apesar de ter sido obrigado a se resignar, ele ainda parecia satisfeito.
_ Seja como
for, você se dispôs a me ajudar. Obrigado, Fei! Você é um cara legal.
Fei
despediu-se de Dan e chegou logo à casa de Alice. Era o bom de viver numa vila
pequena; não demorava nada chegar de um lugar a outro. A vizinha na porta foi a
primeira a recebe-lo, animada:
_ Oi, Fei!
Veio ver Alice? Bom... é costume não se deixar homem nenhum ver a noiva... mas
acho que você pode ser uma exceção. Entre!
Apesar de
ser um “forasteiro”, não nascido em Lahan, Fei havia sido como que adotado pelo
Chefe Lee, era um pintor habilidoso e o conhecimento de artes marciais que
tinha, mesmo sem lembrar como aprendera, já salvara mais de uma vez as pessoas
de Lahan dos monstros que habitavam nas redondezas. A coragem do rapaz e seu bom
caráter tinham conseguido a confiança de todo o povo dali naquele curto
intervalo de três anos. Cumprimentando a tia de Alice, que criara a moça e o
irmão dela depois da morte de seus pais, Fei subiu até o quarto de Alice. Ela
estava lá, fazendo retoques no vestido branco que usaria no dia seguinte.
_ Oi,
Alice. Esse é o seu vestido de casamento?
_ Hã? Fei,
você me assustou! – e voltou-se para o vestido – É sim. Eu acabei de terminar.
Demorou mais do que eu pensava.
_ Hmmm... –
Fei se aproximou e deu uma boa olhada, com ar de aprovação – Você fez um bom
trabalho! Vai ficar muito bem em você, Alice. Parabéns.
_
Obrigada...
Ela desviou
o rosto e alguma coisa no silêncio parecia desconfortável. Fei sentiu-se inquieto, e por um momento, nenhum dos dois disse coisa alguma.
_ Hã,
Alice...
_ Sabe,
Fei...
Os dois
pararam e se olharam, ainda mais sem jeito após tentarem falar ao mesmo tempo, até Fei fazer sinal para que ela falasse.
_ Desculpa,
Alice. O que foi?
_ Ah...
nada.
_ Sei...
Era curioso como estavam sem jeito! Tomando fôlego e respirando fundo, Alice terminou por perguntar:
_ Ah, sim.
Fei... você viu o Dan?
_ Vi sim.
Ele tá lá fora – sorriu – Resmungando como sempre.
_ Ai, esse
menino! E eu pedi a ele para se apressar! Queria que ele me fizesse um favor.
_ Que tipo
de favor?
_ Pro meu
casamento amanhã. Eu queria que ele emprestasse uma câmera e alguns flashes do
Dr. Uzuki, no pico da montanha.
O Dr. Citan
Uzuki era conhecido de toda a Vila de Lahan. Vivia com sua esposa e a filha
pequena no pico da montanha próxima à vila e também era muito considerado pelas
pessoas dali por sua ajuda médica e, também, por seus inventos estranhos. Era
um amigo de longa data de Fei, que se ofereceu:
_ Se é só
isso, eu ficaria feliz em ir pedir pra você.
_ Mesmo?
Ah, Fei, mas ia ser abusar...
_ Que nada,
não é incômodo nenhum. Além disso, não me deixa muito à vontade pensar no Dan
carregando coisas que quebram tão fácil. E pra completar, eu posso ter a chance
de provar mais um pouco da comida da Yui se for até a casa do Doc.
_ Esse é o meu
Fei. Hahahaha!
O riso de
Alice espantou um pouco aquele clima de desconforto de antes, e Fei já estava
quase na escada quando ela tornou a chamar.
_ Fei...
espere um pouco.
_ Hã? – ele
voltou-se – Tem mais alguma coisa que quer que eu traga?
_ Não...
não é bem isso...
Fei ficou
sem entender e ela, ainda sem olhar para ele, perguntou:
_ Fei...
Alguma vez você pensou nas coisas assim? – foi até a janela e continuou, sempre
evitando olhar para Fei – Se... Se, ao menos, você tivesse nascido nesta
vila... e se tivéssemos nos conhecido antes...
Agora foi a
vez dele de ficar sem jeito. Houve silêncio, porque nenhum dos dois sabia o que
dizer, até que Alice disse:
_ ... N-não
é nada. Me desculpe...
_ Bom...
Acho que é melhor eu... ir andando, então.
_ Ah...
tudo bem. Cuide-se e dê minhas lembranças ao doutor.
Fei ainda
olhou para ela um instante antes de sair. Alice ouviu a porta lá embaixo se
fechando e perguntou a si mesma:
_ Isso é o
destino? – e baixou os olhos, vendo Fei tomar o rumo da montanha - Eu me sinto
tão idiota. A quem estou enganando?
Aquela
conversa com Alice acompanhou Fei durante todo o seu caminho rumo à casa do Dr.
Citan Uzuki. Quando algo como o plano de Dan vinha exclusivamente da cabeça
dele, era fácil pensar numa bobagem de criança; vindo de Alice, no entanto, fez
Fei se surpreender perguntando o que realmente teria acontecido se as coisas
fossem como ela imaginara. Meio aborrecido consigo mesmo e sem jeito com o que
estava quase pensando, ele chegou ao topo da montanha sem maiores problemas.
A casa do
doutor tinha três andares, sendo o primeiro a sala de visitas e a cozinha, o
segundo os quartos e o terceiro um observatório de onde se viam todos os
arredores , incluindo a fronteira de Kislev. Ainda havia um último cômodo nos
fundos do terreno onde o doutor fazia suas experiências com eletrônica. Fei
imaginou se ele não estaria lá quando chegasse. E, de fato, quem o recebeu foi
a esposa de Citan.
_ Olá, Fei!
Há quanto tempo.
_ Oi, Yui.
Onde está o Doc?
_ Meu
marido está mexendo na sua sucata lá nos fundos, como sempre.
_ Eu já
imaginava. Será que ele nunca se cansa de brincar com essas coisas? Bom, melhor eu ir falar com ele. Com licença, Yui.
Midori, a
filha do casal, estava tão quieta quanto de costume. Fei costumava brincar com
ela durante suas visitas, mas a menina não estava disposta a sair do lado da
mãe naquela tarde em particular. Indo para os fundos da casa, no entanto, Fei
não via o doutor em parte alguma e nem ouvia o costumeiro som de ferramentas.
Olhando em volta, ele perguntou em voz baixa:
_ Afinal,
onde é que você está, Doc?
Um som de
explosão pareceu fazer o quarto dos fundos tremer e Fei olhou para o alto,
procurando a razão do barulho. Foi quando ouviu uma voz conhecida de lá;
_ Ahhh,
isso não é nada bom! Por que eles usam essas peças tão inferiores? É por isso
que a intervenção deles às extrações...
E lá estava
ele, óculos de quatro lentes no rosto e o costumeiro sobretudo verde, olhando
para uma máquina que mais parecia um caranguejo com uma hélice e com ar de
reprovação a um painel fumegante.
_ Doc!
Então era aí que você estava!
O doutor
voltou-se. Tinha cabelos negros e olhos da mesma cor e um aspecto de intelectual
que combinava com a sua figura. Esse mesmo aspecto traía sua natureza de
estudioso, mas escondia sua outra natureza: o Dr. Uzuki conhecia técnicas de
ether como o próprio Fei e seu conhecimento de artes marciais no mínimo
rivalizava com o do rapaz. Ninguém sabia ao certo do passado do doutor e sua
família e, como sempre eram tão bons com todos, ninguém incomodava procurando
saber. Ele deixou o ar de decepção de lado e abriu prontamente um sorriso ao
reconhecer o rapaz.
_ Ah, olá,
Fei! É bom ver você!
_ Você tá
bem, Doc? O que está tentando fazer aí em cima?
_ Ah, achei
que poderia tentar consertar este Caranguejo de Areia. E, quanto àquela
explosão, não precisa se preocupar. Acontece o tempo todo.
Ambos
riram. Sim, Fei podia se lembrar de visitas anteriores e de algumas vezes em
que ajudara o doutor. Explosões eram comuns na casa do Dr. Uzuki
quando ele começava com suas experiências.
_ Pode
esperar um pouco, Fei? Estou prestes a terminar por hoje. Ah, e a propósito,
tem uma coisa interessante no depósito. Por que não dá uma olhada enquanto eu
termino aqui? Não vou demorar.
_
Claro, Doc. Mas, por favor, se apresse. Vai escurecer antes que perceba.
Fei não
achava nada ruim a idéia de ficar para o jantar. Como dissera à Alice, a comida
de Yui era mesmo excelente. Mas o doutor já se machucara cismando em prolongar
afazeres até depois do pôr-do-sol e foi pensando nisso que o rapaz entrou no
depósito. Lá, bem no meio de várias das coisas do doutor, havia uma caixa
dourada grande sobre uma mesa.
_ Então,
era disso que o Doc estava falando –e começou a tatear a caixa, intrigado –
Vamos ver... O que há de tão interessante em...?
Foi quando
ele tocou num botão lateral e engrenagens começaram a se mover. Fei deu um pulo
de surpresa para trás enquanto a caixa abriu-se para todos os lados, revelando
uma estatueta branca de anjo belíssima, com luzes coloridas piscando por toda volta, e a estatueta começou a girar lentamente enquanto uma canção
suave se fez ouvir, como numa caixa de música.
_ O q-que...
é isso?
Talvez
fosse a estatueta, ou talvez as luzes, mas Fei de repente sentiu um estranho
calor dentro de si. Havia... lembranças... Algo dentro de si que moveu-se
inquieto, e então ele percebeu que era a música.
_ Essa
música...? Eu... tenho a impressão de ter ouvido antes, em algum lugar...?
_ O que
você acha? Nada mau hein?
Fei
voltou-se e o doutor entrou, tornando a saudá-lo.
_ Olá outra
vez, Fei. Desculpe te-lo feito esperar – foi diretamente para a caixa e também
admirou a estatueta por algum tempo, perdido em pensamentos – A música é uma
coisa misteriosa... às vezes, faz as pessoas se lembrarem de coisas que não
esperavam. Pensamentos, sentimentos, memórias... Coisas quase esquecidas...
Pouco importando se o ouvinte deseja se lembrar delas ou não...
_ Doc, o
que é isso...?
_ Foi
retirada de algumas ruínas antigas, e ainda está em reparos. Obviamente é um
equipamento de áudio de algum tipo – e tornou a olhar pensativamente para a
estátua giratória – Há muito tempo, pessoas ouviam esta melodia, como estamos
fazendo agora... Às vezes, eles podem ter ficado alegres... Enquanto às vezes
podem ter sido levados às lágrimas.
Fei ficou
em silêncio, pensando consigo mesmo o quanto o que o doutor dissera parecia
combinar com ele. Ouvindo aquilo ele sentia algo caloroso em seu coração, mas
também uma profunda e inexplicável tristeza, como a lembrança de algo precioso
perdido várias vezes.
_ Aliás, o
que traz você aqui hoje?
_ Hã? Ah, é
mesmo! - Fei subitamente voltou a si, lembrando-se onde estava e o que fora fazer ali - Alice pediu para emprestar a sua câmera, Doc.
_ Ah,
claro. O casamento dela é manhã, certo...? Então, é melhor irmos pegar o que
ela pediu. E, a propósito, Fei, o jantar deve ficar pronto em breve. Gostaria
de se juntar a os?
_ Claro que
gostaria! Eu estava esperando que o senhor convidasse.
_ Bem, eu
ainda tenho que fazer uma limpeza por aqui. Importa-se de fazer companhia à
Midori lá em casa?
_ Claro.
Fique à vontade, Doc. Eu vou na frente e como quando o jantar estiver pronto.
_ Ótimo –
riu o doutor – Vá na frente, então. Mas eu não vou ser responsável se você
ficar com dor de estômago por comer a comida de minha esposa, Yui.
Fei foi até
a porta, ainda sorrindo, mas voltou-se para comentar com Citan, sério de novo.
_ Doc... Eu
me sinto estranho quando ouço essa música... Sinto... algo quente por dentro.
_ Talvez
seja porque você tem alguém vivendo dentro de você - Citan comentou, a mão sob o queixo e parecendo pensativo - E ele também deve ter
gostado desta música há muito tempo atrás, antes de se tornar parte de você...
Fei fez
cara de quem não estava entendendo e saiu, enquanto Citan comentava consigo
mesmo:
_ Meu Deus,
o casamento de Timothy e Alice é mesmo amanhã – seus pensamentos divagaram –
Pode mesmo ser melhor viver uma vida comum, nesta condição... como um filho de
homem...
Citan
balançou sua cabeça, como se para escapar de um pensamento mais profundo antes
de lembrar do que estivera consertando.
_ Bom, que
seja. Acho que seria melhor eu consertar o rotor, pelo menos...
Foi quando
ele percebeu que as luzes coloridas estavam diminuindo depressa, bem como a
música. Voltando-se para a caixa, Citan percebeu que a estátua parara de girar
e parecia se mover de forma diferente. No começo só um balanço, que se tornou
uma tremedeira frenética e cada vez mais forte, até que subitamente se quebrou
em pedaços sem que nada a atingisse. E o doutor Citan Uzuki sentiu um calafrio.
_ Não pode
ser... S-será que... isso é um presságio?
Aproximou-se
e examinou a estatueta. O anjo parecia ter se quebrado de dentro para fora,
apesar de ser uma estátua maciça. Citan tornou a pôr a mão no queixo, como
costumava fazer quando meditando ou preocupado.
_ ... E
agora, o que vai acontecer...?
“RUN THROUGH THE COLD OF THE
NIGHT...
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