quarta-feira, junho 12

LUTA COM O CHEFE

Senhoras, senhores e pessoas leitoras, boa noite e saudações do Louco!

Dando sequência à história, talvez vocês achem que essa coisa de Lenn Trindade indo salvar a mocinha em perigo (ou só o espírito dela) é antiquado, e eu concordo. E daí? Sou um cara antiquado, acho que alguns enredos antigos são legais e, se prestaram atenção, viram que todo o ambiente da coisa é antigo. Logo, tá valendo.

(...)

Encontrar um caminho que o conduzisse aos níveis inferiores da cidade não fora difícil para alguém com a psicometria de Lenn, ou seu talento de historiador. Boa parte da cidade de Vellthia era construída abaixo do nível do solo, como medida extra de defesa caso Rannan, a Cidade Flutuante dos Iluminados, eventualmente fizesse buscas naquela área. Além do mais, dado o que Melisande dissera sobre o tal Tasslus 'não poder tocá-lo na luz', ele bem podia arriscar um palpite quanto ao tipo de criatura que oprimia a moça. E não era nada animador.

Descera por uma escadaria em espiral construída originalmente numa torre cilíndrica, mas tão avariada pela última batalha acontecida em Vellthia que exigira toda a habilidade de Lenn para não cair, ou pisar onde o piso fosse ceder. Alcançara um corredor longo, e agora os olhos de seu corpo disputavam sua atenção com os olhos de sua mente; ora o tapete sobre o piso estava quase completamente coberto de areia e poeira dos séculos de desuso, ora estava seminovo, estendendo-se como uma passarela vermelha até o fim da passagem.

Mas conseguia sentir perigo ali embaixo, uma presença que transmitia frio, cheiro de mofo e de ganância não preenchida. Uma pessoa cheia de planos e projetos próprios, que pouco ou nada tinham a ver com o ideal dos Oito Heróis. Ele avançou com cautela, a Espada Serpente ao alcance da mão, enquanto ouvia as pessoas da época passada discutindo, planejando e batendo de frente com alguém que, secretamente, esperava que 'os oito tolos e os Iluminados se matassem'; ele poderia dar andamento ao que tinha em mente, se fosse rápido.

Um dos conselheiros mais importantes, por ter trabalhado nos projetos de Rannan e conhecer suas entradas e saídas, ele também aprendera algo mais, migalhas do conhecimento dos Iluminados. Mas mesmo aquelas migalhas bastariam para começar, quando os demais se fossem. E escondido dos olhos de todos, Tasslus praticava magia obscura na calada da noite, buscando existir além do tempo, o único verdadeiro empecilho que ele via em sua ambição de governar.

Mas planos formulados sem pleno entendimento são frequentemente má idéia. A batalha acabou quase como ele esperara, embora DeJenshath e Daigal tivessem sobrevivido; os Iluminados não existiam mais... mas, ao colocar seu plano em prática, Tasslus fora descoberto por outros, membros do conselho rebelde que desconfiavam dele. E seu ritual, de qualquer forma, não tivera o efeito que ele esperava.

Se tornara mais rápido, mais forte e quase incansável. Deixara de envelhecer, também. Mas...

Lenn alcançou um acesso para um nível ainda mais profundo, mas não precisava da sua psicometria para saber que a escadaria era um erro. Degraus de madeira, envelhecidos por séculos, e cujas vigas haviam sido comprometidas na batalha final entre Vellthia e Rannan. Descer por ali seria sua morte.

O túnel do elevador antigo,  que deixara de funcionar havia séculos, era um caminho melhor. Ao menos, se ele usasse o gancho e a corda de escalada que trouxera consigo. Havia outro meio, mas ele preferia não arriscar por enquanto; não tinha certeza de que dominara o truque, ainda. E embora a sensação sufocante de mofo e frio se combinasse com o medo e a autopreservação que gritavam para que fosse embora enquanto ainda podia, Lenn se obrigou a continuar. Nunca mais conseguiria dormir em paz, lembrando-se de que Melisande não tinha mais aquela escolha, e sabia que se partisse, não voltaria mais ali.


Alcançou os restos do elevador, que havia cedido e desabado ali havia muito tempo. O corredor se estendia, amplo e longo, uma espécie de avenida principal subterrânea de Vellthia, com vias se espalhando para todos os lados, portas que terminavam em aposentos ou que davam acesso para outros corredores. Um outro explorador poderia passar meses ali, na penumbra, tendo apenas os cristais fosforescentes nas paredes como fonte de luz permanente, tentando catalogar e investigar os vários aposentos e acessos até encontrar o que procurava. Mas para Lenn, a presença de Tasslus era tão evidente que praticamente não haveria diferença se o outro o estivesse chamando em voz alta.

Ele avançou, ignorando as portas à esquerda e direita. Tenso, soltou a Espada Serpente da cintura e a empunhou, até alcançar a sexta porta à sua esquerda, e passar por ela. Tasslus já devia saber que estava ali, e que o estava alcançando. Seguiu pelo corredor por quase dez metros, até chegar ao que antes fora um amplo salão de reuniões, onde os antigos líderes da cidade e os Oito Heróis haviam se reunido várias vezes. E no centro do que, sem dúvida, fora seu lugar de poder, o esquife aberto de Tasslus parecia apenas aguardar o recém-chegado, antes que seu senhor se levantasse.

Um vampiro, tornado poderoso em sua criação e experiente pela passagem do tempo, parecia absoluto ali embaixo, em meio à escuridão e ao pó. Mas existir por tanto tempo cobrara seu preço; sua armadura um dia imponente eram maculada por um manto comprido tão mofado que talvez o tivesse usado desde a última batalha na Guerra da Revolução. Estava semi enlouquecido pela fome, e nunca venceria a distância entre Vellthia e a cidade mais próxima, e sua única válvula de escape ao que parecia fora tornar Melisande ainda mais infeliz do que ele próprio. Mas já não era o suficiente. E, ao sorrir ameaçadoramente para Lenn, ele parecia satisfeito.

_ 'Engraçado... Achei novo uso para minha pequena Melisande, ao que parece! – a criatura rosnou, com olhos que brilhavam na direção do ladrão – Me trouxe sangue e carne frescos... depois de tanto tempo...!'

_ 'É o que pensa, criatura – ele soltou a Espada Serpente da cintura – Ultrapassa tempo de seu fim. Não mais maculará ruínas!'

_ 'Este é e tem sido o meu reino há milênios, bárbaro inculto! – o outro rosnou de volta – Tenho direito de posse sobre cada alma que viveu ou existiu neste território! E agora, sobre a sua também!'


Enlouquecido pela fome Tasslus atacou, e Lenn firmou a Espada Serpente. Agora seria vencer ou morrer.

2 comentários:

Anônimo disse...

Hello. And Bye.

Louco disse...

Hã... Hello. And bye, yourself... ^_^'